0

Resenha – Villa Boa de Goyaz

global_villa_boa

Primeiro livro lido do ano, “Villa Boa de Goyaz” é o retrato da vida e tradições goianas pela perspectiva da tão querida Ana Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas, eterna Cora Coralina.

Não só composto de poesia, mas também de prosa, Aninha fez (mais uma vez) surgir um sentimento enorme de nostalgia daquilo que nunca vivi. Com uma escrita simples e bela, ela nos transporta ao tempo antigo da época em que Goiás se escrevia com “y” e “z” e em que hospitalidade, tradição e fé fervorosa ainda mantinham-se vivos nas pessoas.

Diferente de Vintém de Cobre (primeiro livro que li dela, vindo Villa Boa de Goyaz em seguida), Cora não foca tanto na história de sua vida, mas sim na história da cidade e de sua população. Escrito com ternura, os contos e poesias envolvem o Rio Vermelho, festas tradicionais, as pedras da cidade — sempre tão presentes em sua poesia! — os moleques de rua, a Catedral de Goiás, e, entre outras coisas, não poderia deixar de fora: a devoção à Santa Luzia.

Cora tenta manter viva a lembrança do passado da cidade. Cita os antigos nomes das ruas, há tempos já tão esquecidos, além da arquitetura com influência europeia dos casarões, já reformados, moldados para o novo, com seus telhados e sua história arrancados, dilacerados. É uma leitura rápida não só por causa da quantidade de páginas (que é pequena), mas porque a narrativa é totalmente envolvente. Mantém a escrita descritiva, melancólica, saudosista e ao mesmo tempo esperançosa na medida certa, faz com que o leitor jamais se canse e entre em total sintonia com tudo que é passado.

Nem preciso dizer que Cora Coralina, desde Vintém de Cobre tem me encantado cada vez mais, não é mesmo? Hahaha! Pois bem, Villa Boa de Goyaz entrou para minha lista de livros favoritos — já era de se esperar. O lirismo e a simplicidade de suas palavras me cativam de uma maneira inexplicável, e faz com que a vontade de conhecer melhor a história cultural não só de Goiás, mas de todo o Brasil, cresça cada vez mais.

Bem, é isso. Essa é a minha opinião sobre o segundo livro que leio da nossa doceira e poetisa goiana. Recomendo sem pensar duas vezes a qualquer pessoa qualquer livro (mesmo que não tenha lido todos) de Cora Coralina. É impossível expressar com palavras minha admiração pela pessoa e pela escrita dela. Apenas leiam, rs.

0

Das Pedras – Por Cora Coralina

“Ajuntei todas as pedras
que vieram sobre mim.
Levantei uma escada muito alta
e no alto subi.
Teci um tapete floreado
e no sonho me perdi.

Uma estrada,
um leito
uma casa,
um companheiro.
Tudo de pedra.

Entre pedras
cresceu a minha poesia.
Minha vida…
Quebrando pedras
e plantando flores.

Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude
dos meus versos.”

0

Meu Vintém Perdido – Cora Coralina

“Que procura você, Aninha?

Que força a fez despedaçar correntes de afeto

e trazê-la de volta às pedras lapidares do passado?

Sozinha, sem medo, vinte e sete anos já passados…

Meu vintém perdido, meu vintém de felicidade.

Capacidade maior de ser eu mesma, minha afirmação constante.

Caminheira, caminhando sempre.

Nos meus pés pequenos,

meus chinelinhos furados.

Tão escura a noite da minha vida…

Indiferentes ou vigilantes.

Tanto tropeço.

Na frente, marcando o caminho a candeia apagada.

Procuro minha escola primária e a sombra da velha mestra,

com seu imenso saber, infinita sabedoria, sua arte de ensinar.

(…)

Quando eu morrer, não morrerei de tudo.

Estarei sempre nas páginas deste livro, criação mais viva

da minha vida interior em parto solitário.”

5

Resenha – Vintém de Cobre

Imagem

“Seu Vintém de Cobre é, para mim, moeda de ouro, e de um ouro que não sofre as oscilações do mercado.”

Pouco ouvi falar de Cora Coralina. Até que um dia, uma tia decidiu contar-me mais sobre essa poetisa goiana. Fiquei deslumbrada com sua história, e então, peguei “Vintém de Cobre” emprestado.

Não é fácil descrever esse livro, mas as seguintes palavras o definem muito bem: Surpreendente, lindo, histórico e simples.

Cora Coralina (que na verdade chama-se Ana), nasceu em 1889, “filha de pai velho e doente”, e conta em sua poesia a sua vida. E, para mim, é isso que a torna admirável. As felicidades e traumas da infância, a nostalgia, as lembranças da escola e do sofrimento vivido por aquela gente, naqueles tempos, nos Reinos de Goiás…

É uma leitura fácil, simples. Cora não abusou de palavras “difíceis”, e como há numa poesia, gostava mesmo era da linguagem dos humildes (por isso nunca os corrigia).
Como há nos comentários do livro, Cora foi “simples e direta”, e na minha humilde opinião, qualquer um pode ler. A simplicidade das poesias permite que qualquer um que saiba ler, leia e entenda. Poucas foram as poesias que não compreendi, sendo estas as que, na minha interpretação, tinham a intenção de ser mais subentendidas, ocultas ou até mesmo pessoais demais para serem tão “expostas”… Aliás, são as “Meias Confissões de Aninha”.

Cora Coralina retrata muito bem seu cotidiano da infância. Os costumes das mulheres naquele tempo, a Lei da Hospitalidade que seu avô tanto praticava, muitos detalhes do trabalho realizado na Fazenda Paraíso e muuuitas coisas mais! Isso faz com que o leitor tenha uma visão mais abrangente e veja o quanto o mundo mudou nos últimos 120 anos, no que diz respeito a tudo. É um retrato do século XX.

Esse livro é lindo porque, apesar de tudo ali retratado, Cora mostra otimismo e a felicidade nas pequenices e miudezas da vida. Seus versos são inspiradores, maravilhosos. E o seguinte trecho nada mais é que uma concretização:

“(…)
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.”

Pretendo ler outros livros de Cora Coralina e, quem sabe, visitar sua casa em Goiás Velho… Recomendo demais Vintém de Cobre! É o tipo de livro que todos deveriam ler. 🙂

0

Aninha e suas pedras – Por Cora Coralina

Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.